PENSANDO

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sexta-feira, 3 de julho de 2009

MEU PAI LUTOU PARA SER FAMOSO.

Não conseguiu.
Morreu jovem e teve o funeral mais concorrido que já vi na vida. Nunca tinha visto tanta gente junta em minha casa.
Mas numa época em que isso não era comum e saindo de um grupo familiar que até tinha lampejos artisticos ele queria a fama, as luzes sem ser artista ou ter uma obra. Não sei o quê pensava ele.
Íamos ao estudio da Vera Cruz ver a gravação da novela Redenção da TV Excelsior e ele tentava arranjar um papel de figurante. Íamos no Cirquinho do Arrelia na TV Record e ele queria saber se não poderia fazer alguma coisa para aparecer, Íamos ao circo e ele conseguia um encontro para conversar com a dupla sertaneja Tonico e Tinoco para tentar armar um improvável show no bairro em que moravamos. Iamos aos programas de radio locais onde haviam auditórios e onde se apresentavam duplas sertanejas prá de desconhecidas. Ele queria convidar o Silvio Santos para a festa de casamento de minha tia que foi no quintal de casa num cobertinho perto do tanque de lavar roupas, isso quando o Silvio Santos já era a pessoa mais conhecida e assistida do Brasil. Ele acreditava na bondade das pessoas e que elas topariam qualquer ideia dele. Ele promovia lutas-livres no campinho perto de casa, uma marmelada selvagem que acabava em bebedeira e arruaça de um bando de aldutos infantilizados. Fazia números musicais aos domingos na casa de minha avó onde dublava e imitava um cantor exagerado Orlando alguma coisa ( acho que Dias ) que por não ser correspondido em seu amor arrancava o paletó, se atirava ao chão em desespero e na imitação meu pai acabava rasgando o paletó e quebrando algum enfeite de minha avó. Quanta bronca ele levava dela, ela era uma fera. Ele era atirado, atrevido, sabia fazer de tudo um pouco, mas não sabia fazer nada direito, só fazia gambiarra.
Adorava novidades e ficava alucinado com elas.
Ele sonhava como sonha hoje uma garota de 12 anos que quer ser modelo e ficar rica.
Nunca compreendi esse lado de meu pai. Sua cultura era zero, falava coisas desparatadas e tinha atitudes que sempre o levavam a algum tipo de arrependimento e a um bocado de censura de todos.
Não deu certo. Morreu cedo demais, não aprendeu nada que nos causasse algum orgulho e não fez sucesso, nunca passou nem longe de ficar famoso por segundos sequer.
Acho anti natural que eu tenha 51 anos e meu pai só tenha chegado aos 33 anos. Ele não conseguiu chegar à idade de maturidade que cheguei, e por conta disso arrastou-me um bocado para a sua imaturidade, roubando-me a possibilidade de ser maduro na época certa.
Foi cômico, por vezes entristece lembrar mas foi o sonho dele, um sonho que nos foi imposto, que por muitos anos nos impediu de também sonhar os nossos sonhos.

2 comentários:

Mary Joe disse...

Vitorio, fiquei tentando te imaginar com toda essa verve que vc tem, menininho, ou pré adolescente, pensando nos micos que seu pai pagava.
Acho que talvez seja o caso de vc perdoar a ele por ser como uma garota deslumbrada, querendo ser modelo-manequim, e perdoar a vc, por não ter outra opção a naõ ser seguir todos esses sonhos meio doidos.

Mas amigo, vai mais uma de Mary Joe? Parafraseando o Humberto Gessinger do Engenheiros, "somos quem podemos ser". E se nenhum de vcs dois pode ser diferente. Faz parte. =)

Obs: adoro quando vc fala sobre sua vida no blog. É como se eu pudesse colocar mais um tijolo na construçaõ do que penso ser o amigo Vitório.

creuza disse...

fiquei surpresa em saber estes detalhes da sua vida!!!como podemos gostar tanto uma pessoa e não conhecer nada da vida dela!!! agora sei de onde vem seu talento e amor a arte...a pessoa pode morrer sem realizar seu sonho ,só não pode morrer sem tentar realizá-lo,não é mesmo???